Saturday, 10 March 2012

Heleninha Costa & Ismael Netto 1950-1951-1956

Helena Costa Graziolli  * 18 January 1924 + 11 April 2005 in Rio de Janeiro 
Ismael de Araujo Silva Netto  * 7 December 1925 in Belém-PA + 31st January 1956 in Rio.

Heleninha Costa & seus perfumes franceses.
Heleninha Costa, dona Dolores e o noivo Ismael Neto.
reportagem da revista Carioca de 30 Novembro 1950.

Carnaval 1951 

Heleninha se prepara para o carnaval de 1951, gravando marchas ['Princesa do Sião' e 'Macaco me lamba'] e sambas ['Vida vazia' e 'Bonequinha da Holanda'] para os foliões - 'Quando Momo acordar, estarei já fantasiada e espalhando minhas músicas!', assim falou a simpática cantora da Radio Nacional - Heleninha e seu noivo, Ismael Neto, um casal ideal.

Quando fomos visitá-la sábado passado, apesar da quase tempestade do dia, encontramo-la ao lado da rádio-victrola ouvindo suas próprias gravações, ainda desconhecidas do público, e que marcarão o início dos lançamentos musicais para a festa de Momo. Estava rodeada de discos e os ouvia atentamente, procurando julgá-los como se fosse uma boa foliona decorando as letras. As composições são: 'Princesa do Sião', marcha de Ismael Neto, Paulo Marques e Victor Simon; 'Vida vazia', samba de Paulo Marques e Arlindo Borges; 'Macaco me lamba', marcha de Ismael Neto e 'Bonequinha da Holanda', samba de Pedro Caetano e Clemente Muniz.

A conversa decorreu à respeito de carnaval, de compositores, de fantasias, de radio e de... noivado! Sim senhores! De noivado porque Heleninha está comprometida com o simpático e amável Ismael Neto, um dos elementos de Os Cariocas, famoso conjunto que também apresentará sucessos para a grandiosa festa. Indiscretamente lançamos a clássica pergunta: 'Mas, quando memos os doces?' Disse-nos que em 1951, já deverão estar unidos, e temos a certeza que será um glorioso e feliz casal.

Por fim, surgiu um cafezinho feito pela dona Dolores, progenitora de Heleninha e senhora de extrema simpatia. Logo em seguida nossa entrevista se viu terminada, pois o maestro Chiquinho telefonava, reclamando sua presença para alguns ensaios, dos quais resultarão verdadeiras e empolgantes surpresas para os foliões de 1951. 
reportagem de J. Palhares para a revista Carioca de 30 Novembro 1950.
Heleninha e Isamel inspecionam uma edição de 'Arte de comer bem'; Ismael disse: 'O amor não basta...', e lá foi a coitadinha da Heleninha Costa aprender algumas receitas do clássico 'A arte de comer bem'! O noivo é exigente, não? Sua voz e beleza não chegam?...

Heleninha Costa foi a 1a. a gravar 'Barracão', de Luiz Antônio-Oldemar Teixeira Magalhães, na RCA Victor em 20 Agosto 1952, lançada em Novembro; 78 rpm n. 80-1007, matriz SB-093411.

a very intense young Jorge Goulart.

Revista 'Carioca' de 8 Fevereiro 1951

a revista Carioca tinha uma linha editorial meio simplista, fazendo reportagens de 2 ou 4 páginas, e 'enrolando' ao máximo, isso é, os articulistas pareciam odiar dar informações reais, portanto, andavam em círculos, fazendo citações meta-lingüísticas, isso é, falando sobre o próprio meio [jornalístico] dele, o que denota pobreza cultural ou preguiça mental.

Vejamos o texto dessa reportagem sobre a cantora Heleninha Costa, que sai em companhia de seu noivo Ismael Neto, dos cantores Jorge GoulartNuno Roland e Luiz Gonzaga para comprar fantasias para o Carnaval de 1951.

Jorge Goulart, Heleninha Costa, Ismael Neto, Nuno Roland e Luiz Gonzaga.
ESTAVA SOBRANDO ASSUNTO... por isso o reporter acompanhou o 'bloco' que ia comprar fantasia - Heleninha Costa escolheu um 'bikini' para Jorge Goulart; Nuno Roland afirma que não precisa de fantasia, mas, em compensação, Luiz Gonzaga resolveu vestir-se de 'amor-perfeito'... Uma autêntica confusão a presença dos artistas nas lojas. E quem quiser saber novidades que lêia esta reportagem.

Texto e fotos de Marco Aurélio de Lima

Tínhamos encontro marcado com Heleninha Costa. Queríamos uma entrevista com a simpatica artista, que chegou à hora aprasada em companhia de seu noivo, o jovem Ismael Neto, do conjunto Os Cariocas. Que ironia! Os Cariocas são na maioria paraenses. Mas deixemos de parte os apêndices. Vamos às novidades. Vamos sintetizar tudo porque o problema é o espaço vital em mistura com a preguiça do reporter que não quer escrever muito às vésperas de CarnavalHeleninha vai se casar em junho [1951], possívelmente. A intriga começou com uma reportagem dêste reporter. Felizmente deu certo! Outra novidade. Uma grande novidade: Luiz Gonzaga deixou a Radio Nacional no dia 30 de janeiro [1951]. Vai viajar para Pôrto Alegre e, depois, irá à Europa divulgar o baião. Acreditamos no êxito do cabôclo! Ele saberá representar o Brasil. Mais novidades ainda: Jorge Goulart, o tal que afirma que o coração não engana e que quer uma sereia de Copacabana, não osbtante acharmos que as do Leblon são igualmente 'bem acabadas', deixou a Nacional e assinou um vantajoso contrato com a Radio Cultura de São Paulo, onde esteve vários dias. Foi à boite Bambú onde conheceu nosso amigo Cattan que lhe ofereceu o que de melhor havia na casa. Um grande sujeito o Cattan! Pois bem, querem mais novidades?

Nuno Roland anda pela Nacional apesar dos boatos de que deixaria a emissora lider. Chegou do Rio Grande do Sul. Chegou de coreana e vai voltar, porque gostou do ar fresco dos pampas. E ainda querem saber de mais alguma coisa?... Querem?

- Chega. Lá em baixo na rua, todo mundo, com ou sem máscara, brincando, enquanto damos duro aqui dentro...

Daqui a pouco voltaremos à rua para ver o que vocês estão fazendo para depois dizer aos outros aquilo que outros não viram. Mas acontece que precisamos encher três laudas. Resumimos tanto que acabou faltando assunto. Contemos portanto a história das fantasias e o comêço desta reportagem.

Comprometeramo-nos a publicar a letra de uma gravação de Heleninha. Que maravilha! Só a letra vai ocupar um espaço enorme. Querem ver?...

BONEQUINHA DE HOLANDA  - Bonequinha que veio da Holanda...(e são 13 linhas de letra de música]); O samba que estampamos acima foi escrito por P.Caetan o e C.Muniz.

Outra gravação carnavalesca de Heleninha que está sendo bem aceita pelo público é: 'Vida vazia', de autoria de Paulo Marques e Arlindo Borges: (e são mais 11 linhas de letra de música); Chegou?...

- Naturalmente. Vamos à história das fantasias. Pois bem, nós saimos da redação rumo ao comércio. Gonzaga, eternamento 'do contra', só fazia contrariar o bloco. Não concordava com coisa alguma, mas, quando as garôtas o cercavam, êle sorria. E como elas gostam dele! Ficamos até com inveja. O homem da sereia de Copacabana, que é filho de um grande reporter, por questão de afinidade, escolhia fantasias e ângulos. E depois que o homem do Mandarim nos mostrou todo o estoque, saímos com as mãos abanando, porque Luiz Gonzaga decidiu que iria passar o carnaval longe do reboliço da cidade; Heleninha está noiva e Goulart só precisará de uma tanga, já que sereia, em Copacabana, só de tanga. Fim!

Que texto mais absurdo. Seria uma boa peça a ser apresentada num curso de jornalismo para que os alunos saibam o que não fazer nunca. O articulista confessa sua preguiça e alegra-se com o fato de 'encher lingüiça' com a publicação de 2 letras-de-música que ocupam 25 linhas. Que grande sacana, que enganador! Que falta de ética, diria eu! Ele não está pensando no leitor, objeto de seu trabalho, mas em sua própria comodidade. É assim que se faz um país. Com atitudes como essa, onde a ética é objeto de escárnio e chacota.

Toda essas informações poderiam ter sido escritas em 3 parágrafos, e o articulista iria descansar e o leitor não perderia seu tempo lendo 'abobrinhas' e 'encheção-de-lingüiça'. Infelizmente o jornalismo no Brasil é assim até hoje. Deus nos acuda! Luiz Amorim.
Ismael Neto acompanhado da noiva Heleninha Costa, Jorge Goulart & Luiz Gonzaga, o Rei do Baião.
Jorge Goulart mostra seu lado elegante experimentando todo tipo de fantasia...
charm & poise.
Heleninha Costa prepara-se para cantar enquanto Cesar de Alencar deixa o palco.
Heleninha Costa em Maio 1946.
Ismael & Heleninha who resembled Louise Brooks in a way... 
When Ismael Neto died on 31st January 1956, his sister Hortência Silva took his place at the vocal group Os Cariocas.

Ismael Netto had been working at Radio Nacional with his group Os Cariocas for a year when Heleninha Costa was about to debut on 'Canção romântica', in December 1946. Os Cariocas were to accompany the new singer but they didn't have much time to rehearse. 

Heleninha was anxious about her presentation and finding the arrangement difficult asked Ismael for more details about its progress. Ismael, who was a hard-working musician wasn't very forthcoming and Heleninha was left to fend for herself. 

She went on to sing her number and fumbled badly. Heleninha felt Ismael was a heartless man and never talked to him again.

As time went on, Heleninha & Ismael often had to inter-act and gradually the wall between them came down. Actually, as soon as Ismael realized how cold and uncaring he had been with Heleninha he tried to mend his ways. Soon they were sharing the same venues and working together on songs. 

As Heleninha's mother could not accompany her daughter in every gig, Ismael ended up being her chaperon, as Brazilian ladies in the 40s and 50s were not supposed to go places by themselves without their 'dueñas'. 

Heleninha and Ismael became sweethearts but hid that fact from everyone, especially their families. But as love conquers all they became engaged in December 1950, and got married on 4 December 1951. 

Heleninha Costa & Ismael Neto get engaged in December 1950.

Em 1946, foi anunciado que a Radio Nacional contratara mais uma cantora, que deveria estrear no programa ‘Canção romântica’. Seu nome era Heleninha Costa, que até então atuava na Radio Mayrink Veiga, PRA-9. Todos estavam ansiosos por conhecê-la e no dia da estreia só havia uma pessoa que não estava lá muito satisfeito com a nova estrela; Ismael Netto, chefe do conjunto vocal Os Cariocas.

Heleninha deveria cantar acompanhada por seu conjunto. Uma das músicas escolhidas para o lançamento da nova estrela fora ‘Bote... bote...’ de Dorival Caymmi. Sendo um arranjo difícil e estando a cantora nervosa e mesmo não conhecendo bem o estilo d’ Os Cariocas, erraram diversas vezes durante o correr dos ensaios.

Heleninha sentiu que Ismael tivera pouca paciência com ela, pois quando pediu-lhe mais detalhes sobre o arranjo, ele, de ‘cara amarrada’, disse: ‘Você entra aqui, modula depois, neste sol, aqui há uma pausa de dois tempos... Entendeu?'

‘Entendi, sim, obrigada!’, respondeu Heleninha, bem compreendendo o mau-humor do colega. No entanto, pensou: ‘Ele deveria saber que é o arranjador e conhece bem a música. Meu Deus, como é que eu vou cantar isso?’

Iniciado o programa, o locutor anunciou a estreia da noite. Heleninha aproximou-se do microfone e o resultado, como era de prever, foi desastroso. Heleninha errou e diversas pessoas notaram. Ismael murmurou um ‘diabo!’ entredentes. Ela, daquela data em diante, não mais dirigiu uma palavra ao arranjador que lhe fizera cometer tal gaffe logo na sua estreia. 

Ismael ficou com pena da jovem cantora e lamentou a sua falta de atenção. O arrependimento, porém, foi tardio.  Durante longo tempo os dois se mantiveram brigados. 

Os meses passavam. Devido a designações da estação, muitas vezes Heleninha tomava parte no mesmo programa com Ismael, e como era de se esperar, os dois voltaram às boas. Ismael pediu desculpas e a estrela aceitou.

Tornaram-se bons amigos. A raiva que se dispensavam mutuamente se transformou em amizade. Quando ele tinha um show sempre a convidava para tomar parte, e quando ela era convidada para um espetáculo sempre envidava o melhor de seu esforço para que Ismael também fosse chamado.

Essa amizade já se estendia por 3 anos. Aproximando-se o verão, os dois, frequentemente eram convidados para shows carnavalescos. A genitora de Heleninha , devido a alguns compromissos, de um momento para outro viu-se impossibilitada de acompanhar a filha aos seus espetáculos.

Heleninha pediu a Ismael que a acompanhasse. Este, de bom grado, atendeu-a e depois dos shows saíram juntos. Surgiu o namoro que ambos ocultavam de suas famílias. E por fim, o arrependido Ismael pediu em casamento a sensível Heleninha. Estão noivos e felizes.

Tendo que voltar de shows altas horas da noite, Ismael se prontificou a deixá-la no caminho de casa... ele mora em Lins de Vasconcelos e ela no Flamengo.

Assim nasceu o amor. Vieram os passeios, as trocas de confidências e os planos. Ismael tornou-se uma espécie de empresário de Heleninha e é hoje quem resolve a maioria de seus negócios. No futuro, segundo nos declarou, ele pretende abandonar o radio, depois que alguns anos tiverem passado e tenham nascidos alguns pimpolhos para alegrar seu lar.

Revista do Radio, 9 January 1951; article written by Antonio Rocha.

Ismael se compenetrou de seus deveres de noivo: ‘Anteriormente não tinha razão para viver. Era desinteressado em tudo. Não levava nada a sério.  Mas hoje, Paulo Marques tem que ter outro companheiro para as farras, porque delas só resta a lembrança...’

Heleninha confirma, dizendo que Ismael também representa o seu maior estímulo. E olha para ele, perguntando suavemente: ‘Posso dizer, bem?’ Ismael reluta, mas acaba assentindo e Heleninha nos diz: ‘Há poucos dias comentava com o Ismael que o nosso amor deve ser diferente, pois com o passar dos dias parece tornar-se mais intenso, ao invés de arrefecer, como acontece com tantas pessoas...’

Ismael sorri, acende um cigarro e retruca, quando lhe perguntamos quais são os planos para o futuro: ‘Esperamos empreender uma viagem de estudos à Europa. Espero tornar-me compositor clássico e sei que para isso é necessário muito estudo e perseverança.'

‘Você sabe’, diz repentinamente Heleninha, ‘o Ismael é um dos raros homens que eu conheço que gosta de vestidos apertados e decotados. Antes eu usava vestidos simples, mas notei que ele preferia deste tipo que uso agora. Por isso...’

Sorriram todos. Em seguida perguntamos sobre os preparativos para o casamento. ‘Já compramos um apartamento no Leme. E não resta a menor duvida que este é o maior problema para os noivos de hoje.’

Os ponteiros pareciam pular. Heleninha tinha que sair para gravar ‘Cartas de amor’, uma versão de Lourival Faissal do famoso fox ‘Love letters’, de Victor Young e letra de Edward Heyman. ‘Nunca tivemos necessidade de nos corresponder, pois para onde quer que eu vá sempre o Ismael me acompanha, por isso essa gravação de ‘Cartas de amor’ é oferecida a ele’, diz Heleninha.

Ismael diz que o casamento será em Dezembro de 1951 e que passarão a lua-de-mel em Buenos Aires ou São Paulo... tudo depende da Radio Nacional. 

Heleninha Costa & Ismael Netto got married on 4 December 1951, at the Catholic Church of Nossa Senhora da Gloria (Our Lady of Glory) at Largo do Machado, in Laranjeiras. Even though Ismael was a member of the Baptist Church, a Calvinist sect, he agreed with a Catholic wedding to please Heleninha. 
'Jornal das Moças', 3 January 1952: the wedding of the year: Heleninha Costa & Ismael Neto.
Heleninha's father Eduardo de Andrade Costa leads her the aisle...
best man Dick FarneyIsmael, & Heleninha, radio-actress Ismenia dos Santos & Victor Costa, director of Radio Nacional at the Catholic Church at Largo do Machado, Laranjeiras. 
best man Dick Farney watches while a Catholic priest blesses the bride & groom. Even though Ismael belonged to a Calvinist church denomination he submitted to Heleninha's wishes to marry according to the Catholic Church rites. 
Heleninha signs up while Ismael & her father look on. 
Heleninha & Ismael cut the wedding cake; Dick Farney smiles...
Revista do Radio shows a photo-article about the happy couple in their love nest at Leme. The magazine depicts Ismael as thinking about the arrival of a baby brought in by the stork herself. These were cute pieces Revista do Radio published to delight their mostly female readership.
Ismael having a shower while helpful Heleninha fetches him his towel.
strolling down Avenida Atlantica, Copacabana. They live in a flat in Leme. 
Heleninha relaxes while Ismael cares about her.
Heleninha & Ismael kissing time.

Ismael Neto (30)  suddenly dies on 31st January 1956

To everyone's surprise and consternation the news of the demise of Ismael de Araujo Silva Netto, hit the Brazilian show business world with disbelief and sadness on Tuesday morning. Ismael had just turned 30 years old only on 7 December 1955.

Not much was known about his health except that Ismael felt ill on the Monday, 30 January 1956, and his family rushed him to Hospital Dr. Gerson de Paula Lima, on Rua Conselheiro Josino, 34, near the Brazilian Senate in Rio de Janeiro, where he stayed overnight. Before noon on Tuesday, the Hospital declared that Ismael Netto had died of liver failure. A liver crisis had set in but no further details were forwarded to the press. 

Apparently Ismael's health was good. He never missed a day's work at Radio Nacional or failed to show up at gigs he had with Os Cariocas at night clubs or at his wife's Heleninha Costa musical dates. Judging by photos taken in recent past one might say Ismael was perhaps a little over his right weight.

Revista do Radio - as usual - took a photo of Ismael's body laid in state. It may be considered tasteless nowadays, but it was common practice in Brazil in the 1950s.

Ismael de Araujo Silva Netto
* 7 December 1925, in Belém-PA
31st January 1956, in Rio.

the unthinkable happened: Ismael Neto died suddenly on 31st January 1956.
  
Ao findar-se a manhã de terça-feira, dia 31 de janeiro de 1956, num quarto do Hospital Dr. Gerson de Paula Lima, na rua Conselheiro Josino, 34, na Esplanada do Senado, falecia Ismael Neto, chefe do conjunto Os Cariocas e compositor de ‘Valsa de uma cidade’ e ‘Canção da volta’ entre várias.

Figura das mais populares nos meios artísticos, Ismael era casado com a cantora Heleninha Costa, desde 4 de dezembro de 1951, depois de um noivado que os fãs acompanharam com enternecimento. Vivendo felizes, conforme divulgavam as reportagens fotográficas que a Revista do Radio, por diversas vezes publicou com o casal. Heleninha e Ismael entendiam-se carinhosamente, vivendo uma longa lua-de-mel que só a morte fez terminar. 

Nada parecia indica nele qualquer enfermidade mais séria. Robusto, sempre alegre e cordial, Ismael Neto jamais deixara de comparecer aos ensaios e programas na PRE-8. Ele e Heleninha sabiam receber os amigos e comparecer às festas do radio.

Atacado, repentinamente, de um mal do fígado, foi ele recolhido, na segunda-feira, véspera de seu desenlace, àquele hospital, falecendo horas depois, quando ainda nem se sabia de sua enfermidade. A notícia consternou todo o radio e o público, ainda não refeito da tristeza causada pela morte de Augusto Calheiros há menos de 3 semanas, em 11 de Janeiro de 1956. O enterro foi no Cemitério São João Baptista, tendo a cerimônia de despedida sido oficiada por um pastor da Igreja Baptista, religião que professa a família. 


Heleninha Costa, inconsolável é confortada por Bob Nelson e outros colegas do radio. 

'Correio da Manhã' 2 February 1956 - brings the shocking news of the Ismael Netto's death.

Sunday, 4 March 2012

VANDER LOUREIRO, cantor.

Vander Loureiro, acompanhado por Carlus Maximus (Luiz Amorim) no Pateo do Collegio em São Paulo.
Carlus Maximus acompanha Vander Loureiro, que é ajudado por Sirley.
Gabriel Gonzaga acompanha Salomé Parisio. Hugo Giovanelli checks it out!
Carlus Maximus, Thais Matarazzo, Ricardo Santos & Vander Loureiro numa tarde de terça-feira no Pateo do Collegio.
Gabriel Gonzaga, Ricardo Santos, Thais Matarazzo & Fabio Siqueira.
Thais Matarazzo, Shirley & Denise Duran numa tarde de 3a. no Pateo do Collegio circa 2009.
Vander canta no choro de sábado na Contemporânea em 2010.
Vander Loureiro canta 'Por causa dessa cabocla' de Ary Barroso, na Contemporânea - 31 Mar 2012.
Beto Abrantes, Carlus Maximus & Vander Loureiro at Casa de Portugal. 

HORMINDO RETAMERO, cantor-de-tangos

Longa-duração de Hormindo Retamero prensado pela gravadora Continental.
Contra-capa do LP do cantor brasileiro Hormindo Retamero.
lado A.
lado B.
Hormindo Retamero nos anos 1950.
Hormindo Retamero canta acompanhado por Carlus Maximus no Pateo do Collegio.
Hormindo era um performer natural... ele cantava impromptu, a capella, onde for que estivesse...
Hormindo Retamero e Salomé Parisio acompanhados por Gabriel Gonzaga no Pateo do Collegio.

Neuza Guerreiro  entrevista  Hormindo Retamero  - 15 Março 2005

(Thais Matarazzo participa como ouvinte. Pérola chega no terço final da entrevista.)

Neuza Guerreiro: Qual o local de seu nascimento?

Hormindo Retamero: Jahú, Jahú.

N.: E data de nascimento?

H.: 27 do 12 de 22 - 27 Dezembro 1922! Parece que eu tenho 85, 86, mas tenho 82 anos mesmo. 82 mil km rodados! [risos]

N.: Qual é a origem de sua família? Origem étnica?

H.: Espanhola, de Granada.

N.: Sul da Espanha?

H.: Sim!

N.: Invadida pelos mouros?

H.: Sim, há muitos anos estive lá. Gostei muito.

N.: O sr. nasceu aqui no Brasil porque seus pais vieram como imigrantes?

H.: Em 1912.

N.: O sr. se lembra de seus avós?

H.: Muito vagamente! Só de minha avó.

N.: Então fala alguma coisinha dela.

H.: Minha avó era uma velhinha, que quando me encontrava, me dava dozento-réis, quinhento-réis. Eu ficava louco de alegria. [todos riem]

N.: Ela era espanhola?

H.: Ô !

N.: Como é que ela chamava?

H.: Carmen.

N.: Bom nome, de espanhol mesmo, né? Era essa avó que o sr. se lembra?

H.: Só. O outro eu conheci de fotografia. Francisco Olmos, cara elegantão; que nem eu! Que eu fui elegante também. Parece que não, mas já fui um dia. [N. ri] É bom dar uns pulos na vida!

N.: Agora, fala alguma coisa sobre seus pais.

H.: Meu pai, trabalhador. Foi administrador, onde eu nasci, na Fazenda do Chiquinho Pacheco, em Jahú. Nasci lá. Saí de lá com 4 ou 5 anos. Saí, não; meus pais me trouxeram. Eu tinha cachinhos. Ainda tem fotografia! Minha mãe guardou um cachinho meu até há poucos anos, no modo de dizer, é! E eu chorava porque perguntavam se eu era menino ou menina. [N. e T. riem] Eu era bonitinho, sim. Agora eu sou meio feião, mas era bonitinho.

N.: Mas o sr. ainda se lembra de seus pais? Eles eram bravos?

H.: Não, meu pai era de uma personalidade fóra-de-série. Eu apanhei uma vez só; uma chinelada da minha mãe. Como dizer que meu apelido era "la malva de la casa"; faz uma ideía, né! como eu era bonzinho!! Eu enchia o tanque de água para minha mãe lavar roupa; ia fazer compra; e um irmão meu dizia: "Ah, tá fechado!", só para não ir.

N.: Essa é uma boa lembrança dos seus pais que o sr. tem né?

H.: Ô !

N.: E o sr. foi casado? É casado?

H.: Eu conheci a minha esposa quando eu tinha 8 p’ra 9 anos. Nove anos! Eu estava jogando bolinha e passou um amigo que era conhecido como ‘Pula-Brejo’. O Toninho conheceu o João Pula-Brejo! "Aonde você vai?" Ele respondeu: "Ah, eu vou pedir serviço numa fábrica de boneca." – "Então eu vou junto com você!" E fui. Cheguei lá, e a que veio a ser minha sogra estava descascando batatinha, com uma travessa dessas de ágata. E o rapaz entrou. "E vos otros, quieren también servicio?" Eu falei: "Quero, sim senhora!" Aí o seu João, marido dela, estava fazendo verniz no quintal. Verniz p’ra envernizar as bonecas. Ela falou: "Hay ahi dos niños!" Era eu e um amigo meu, Cesário França, estabelecido em Suzano, com material de construção atualmente. Bom, "Hay ahi dos niños!" Minha sogra era viva até outro dia! Muito esperta. Ele falou: "No, no precisa!" – Aí ela lembrou do pior trabalho da fábrica, e ela falou: "Y las tiras?" As tiras – tapa-tiras, era um trabalho desgranhento de ruim!

N.: O que que é isso?

H.: Tapa-tira! É... faziam as duas peças. Por exemplo, o bracinho [da boneca] tinha duas peças e depois que cortavam as rebarba, ainda ficava um pouquinho, umas aberturinhas. Então tinha que passar cóla e passar a fita em volta. Fui o melhor tapador de tiras. [a Pérola está chegando]. Ólha como ela está bonita! Gostei do cabelo hoje. Aí fiquei lá alguns anos. De lá, abrimos uma fábrica. Péra, não! Fui trabalhar no Ulisses Nogueira, uma outra fábrica de boneca. Vamos dar um salto agora p’ros 20 anos? Fazer quiném a história do homem, né! 14 anos, 20, 40. Essa eu conto depois, fóra da gravação. Aí abrimos uma fábrica, eu e meu irmão. Rua do Ouro, 370, antigo 44. Fábrica de Bonecas Branca-de-Neve! Trabalhava quiném um louco, mas dáva para o arroz-e-feijão. Agora vamos a quanto? Vamos passar p’ros 20 anos? Vamos 23, 24 anos. Eu, apaixonado por tangos de Gardel: "Puxa, preciso conhecer a Argentina. Ah, vou conhecer Buenos Aires." E me arranquei. Ah, mas que pinta!

N.: Eu pensei que você estivesse apaixonado pela Maria!

H.: Olha! Ô ! Já contei esse pedaço! [risos]. Aí fui p’ra Buenos Aires. Tive que vender um terreno, que eu estava pagando à prestação na Vila Santa Terezinha. Vendi! A pessoa que comprou fez um bom negócio; que eu vendi baratinho. Peguei um trem aqui na Estação da Luz. Avisa quando está na hora de começar a encerrar, que eu vou p’ros 60 já! [Neuza ri]. Daí fui p’ra Buenos Aires. Cheguei lá louco! [alguém chegando e passando pela mesa onde a entrevista está sendo feita]. Olha, esse aí faz anos depois de amanhã, heim! Cheguei em Buenos Aires, e eu era estampador aqui no Brasil. Eu fui estampador na Estamparia Fernandes, na rua Tuiúty, lá no fim! Quando eu pedi emprego numa estamparia em Buenos Aires, queriam me pegar na hora, pela falta que fazia! Imagina que diferença hoje, heim! Aí eu comecei a trabalhar de estampador. Aí, quando eu saía da estamparia, eu ia cantar no Parque Retiro. Agora, por que você foi cantar? Porque numa tarde que eu fui conhecer o Parque Retiro, que era antigamente Parque Japonés, eu peguei o telefone público: "Con permiso?" Peguei, e liguei para minha cunhada. Falei: "Escuta, Dalva, fala p’ro Francisco trazer a Lizete neste parque, que é uma maravilha." Antigo Parque Japonés, Parque Perón, Parque Retiro – teve vários nomes. Aí quando eu desliguei, veio um camarada e disse: "Usted es brasilero?", "Sou brasileiro.", "Uh, peró que me gusta es la musica brasilera! Alegre!" Falei: "Ah, é?" Eu fumava naquele tempo quiném uma besta! Não devia ter fumado nunca! Peguei a caixinha de fósforo e comecei: [cantando um sambinha] "Se eu fico em casa você tá falando, se eu vou p’ra rua..." "É isso, é isso!" E gostaram e juntou gente. Um camarada, que era dono de uma barraca daquelas que fazia espetáculos, me abraçou e falou: "Este me lo llevo para el boogie-boogie!" E cheguei no boogie-boogie e me apresentaram: "Este es el brasilero que canta. Mirenlo como canta!" Eu fazia só p’ra chamar atenção: [cantando] "Brasil, meu Brasil brasileiro..." "Vaian, vaian pasando..." E aquilo era só farol, porque eu nem conheço a letra dessa música! [N. ri]. E aí cantava. Recebia 12, 13 pesos por noite, e fui pondo na Caixa Econômica. Com o que eu ganhava na estamparia e cantando à noite, eu juntei um dinheirinho e pus na Poupança. E um dia eu resolvi vir embora, que me bateu a nostalgia! Eu falei: "Vou embora!" – E vim embora! [Falando para a Pérola]: Namorei aquela moça que você conheceu... o pai dela... [Pérola diz algo inaudível... traição!] No, no, mas isso foi de passagem. Isso foi uma fraqueza da minha...

documento argentino de Permissão para Trabalhar quando Hormindo viveu em Buenos Aires.

N.: Quando é que o sr. casou?

H.: Eu casei com 33 anos, aqui no Brasil já! [1955] Cansado de Vila Sofia; cantei na Vila Sofia. Cantei no Lilas, o famoso Lilas. Vai muito longe isso? [referindo-se à fita cassette do gravador da Neuza].

Maria & Hormindo Retamero.

N.: Não, eu paro quando... pode deixar que eu encaminho. Fala agora da sua esposa um pouco.

H.: A minha esposa é a coisa mais maravilhosa! Ontem, esta noite mesmo, eu deitado, eu pus a mão assim por cima dela, que já estava altas horas da noite, e aí eu falei: "Puxa vida, eu não pensei que Deus ia me dar uma esposa tão maravilhosa." – E ela falou: "E eu também nunca imaginei que você fosse um marido que é!" - Eu falei: "Ih! Com essas declarações nós estamos feitos!" [há um burburinho entre as várias ouvintes].

N.: Cuidado que as coisas vão...

H.: Não! Minha esposa, ela é muito bacana! Muito, muito! Ela teve uma educação bacana.

N.: O sr tem filhos?

H.: Não! Dios me quiere mucho! Porque dizem, dizem que aquele que não tem filho, el diablo les dá sobrinos! Aqueles que não tem filhos, o diabo lhes dá sobrinhos. Eu tenho uma porção de sobrinhos que me querem muito bem. Estamos tocando a vida. Já estou com 82 e ela com 83, mas parece que tem 3 ou 4 menos que eu. N.: Então, atualmente o sr. vive com sua esposa só?

H.: Ô ! E vou viver até a morte, que não está longe; não brinca, ô!

N.: Quanto tempo o sr. está nesse grupo de colecionadores?

H.: Aqui, acho que uns 10 anos, né, Pérola? Por aí, 10, 12 anos. Pérola: Eu estou há 7 [anos].

H.: Eu já nem me lembro. Tá quanto?

P.: Há sete!

N.: Como é que o sr. chegou até aqui? Como é que o sr. descobriu aqui?

H.: Eu cheguei aqui por causa de um motorista vagabundo! Não quis me abrir a porta [do ônibus] na Praça da Sé, que eu ia tomar o metrô; e ele falou [imitando a voz do motorista do ônibus, que se recusou a abrir a porta]: "Aqui eu não posso abrir!" Assim com bronca! Quando chegou aí [na frente do Pateo], eu, p’ra mostrar p’ra ele, que ele não tinha me prejudicado, desci e vim andando diréto aqui p’ra entrada do Pateo. Cheguei e ia passando; tinha 2 ou 3 meninos falando em bandoneón; aí eu falei: "Já estão mexendo comigo! Falou em bandoneón, mexeu comigo!" – "Por que?" disse um deles. "Ah, porque eu gosto!" - "Ô, então senta aí!" E começamos a bater-papo. [começa a tossir] É por causa do bendito cigarro, ó... [tósse] Ó o cigarro, lindo aí.

N.: E quando o sr. chegou aqui as reuniões já eram aqui neste lugar?

H.: Não!! Que !! Faziam reunião aí fóra. Punham os discos na calçada.

N.: Qual é a musica que o sr. prefere?

H.: Tango, tango, tango que me hiciste mal y sin embargo te quiero porque sos el mensagero del alma de Arrabal. Bonito, né?

N.: E seu intérprete preferido?

H.: Adivinha se é o Carlos Gardel? [todas riem]

N.: O sr tem algum acervo específico? Coleção de discos?

H.: Tenho só... quinhentos... quase 600 números de Gardel. Só em fita.

N.: Bom, eu gostaria de ficar aqui muito mais tempo... muito obrigada.

H.: Eu é que agradeço.
uma foto de Carlitos Gardel em homenagem ao nosso querido amigo Hormindo Retamero.